A ameaça de cortar o sinal do GPS para o Brasil merece esclarecimentos. A primeira vez que ouvi falar — ou melhor, que li a respeito — de GPS foi em uma revista americana na biblioteca da Universidade Federal de São Carlos, em 1983. Fiquei mais interessado na distorção do tempo que ocorre no satélite, devido à sua velocidade e à massa da Terra.
O GPS (Global Positioning System), dos Estados Unidos, é um dos sistemas globais de navegação por satélite (GNSS) existentes. É composto por uma constelação de 24 satélites necessários para cobertura global, além de alguns extras, de reserva. Estão a uma altitude de 20,2 mil km. O sistema tem uma precisão de um a três metros em aplicações civis, mas pode ser ainda mais preciso com técnicas de correção, como as utilizadas na agronomia, por exemplo.
Há também o GLONASS (GLObalnaya NAvigatsionnaya Sputnikovaya Sistema), da Rússia, que possui 24 satélites operacionais em órbita, além de unidades reservas. Também com cobertura global, opera a uma altitude de 19,1 mil km e tem precisão de dois a quatro metros para uso civil.
Mais recentemente, surgiu o Galileo, da União Europeia, com 28 satélites em órbita cobrindo todo o globo, a uma altitude de 23,2 mil km. Oferece precisão de até um metro no serviço aberto e ainda mais no serviço público regulamentado.
Também está em operação o sistema da China, chamado BeiDou — palavra que significa “Estrela do Norte”, em referência à constelação da Ursa Maior. Com cobertura global, possui 24 satélites a 21,5 mil km, três em órbita geoestacionária e três em órbita geossíncrona inclinada. A precisão para uso público varia de 2,5 a 5 metros, e chega a 10 centímetros para uso militar e comercial.
Além desses, há sistemas regionais, como os da Índia e do Japão, que poderiam servir de inspiração para que o Brasil desenvolvesse o seu próprio. De qualquer forma, além do GPS, temos hoje acesso aos sistemas russo, europeu e chinês. Aqui em São Sebastião (SP), onde moro e escrevo este artigo, meu celular detectou 12 satélites GPS, 6 GLONASS, 13 GALILEO e 8 BeiDou, além de alguns indianos e japoneses. Como se vê, poucos usuários teriam dificuldades, pois a maioria dos dispositivos já aceita múltiplos GNSS.
A aviação, por sua vez, deve enfrentar poucos problemas, pois ainda conta com os sistemas VOR e DME. O VOR (VHF Omnidirectional Range) transmite sinais que permitem à aeronave determinar sua posição angular — o mesmo princípio de uma bússola. Já o DME (Distance Measuring Equipment) mede a distância entre a aeronave e a estação, enviando um sinal que é respondido, de forma semelhante a um radar.
O Gabinete de Segurança Institucional criou, em 1º de julho, um grupo técnico para estudar o desenvolvimento de um sistema brasileiro de posicionamento, navegação e tempo, além de diagnosticar as vulnerabilidades atuais, entre outras atribuições.
O que pouca gente sabe é que, em maio de 2000, o presidente Bill Clinton desativou o uso da Disponibilidade Seletiva do GPS e, em 2007, o governo americano eliminou essa limitação nos novos satélites, afastando uma fonte de incerteza que preocupava usuários civis em todo o mundo. Será que o presidente Trump destruiria o negócio do GPS por causa de criminosos brasileiros?
Mario Eugenio Saturno (fb.com/Mario.Eugenio.Saturno) é tecnologista sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano.